segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Sobre as moscas que pousam nas sopas


Manifestantes queimam revista Veja em frente ao Palácio da Redenção

Dia 3 de setembro participei do “Grito dos Excluídos” em João Pessoa. Não, eu não sou sem terra. Sou estudante de Ciências Sociais. Já falei aqui sobre os problemas envolvendo os cientistas sociais na Paraíba. Também já discorri acerca da presença marcante das ideologias de extrema esquerda na Universidade (tem gente que por uma gota d’agua ta fazendo o maior fuzuê no meio da rua). Durante a mesma semana do protesto, estava ocorrendo na capital da Paraíba o Encontro Nacional de Estudantes de Ciências Sociais. Neste contesto, os cientistas sociais integraram uma das alas da manifestação.

Eu cheguei a me sentir deslocado, mais minha participação vale como experiência de vida, alem de ter sido muito interessante do ponto de vista de acompanhar o comportamento das classes participantes do Ato.

Nós, cientistas sociais, usávamos uma camisa branca com frases em vermelho e preto. Na frente, lia-se: “MARANHÃO, cadê os cientistas sociais no Ensino da Paraíba”, e atrás “FORA Sales Gaudêncio e Terezinha Fernandes”. As diversas faixas por nós entendidas deferiam diversas acusações e críticas ao Governo do Estado e a alguns de seus representantes.

Foi um liquidificador de ideologias. Em cima de um trio elétrico, um jovem aparentando uns vinte e poucos anos, de camisa vermelha (cor sugestiva), animava a galera: “Saldar os companheiros da causa tal... saldar os companheiros do movimento X... os companheiros da causa Y...”. Entre um companheiro e outro, um grupo musical cantava “Mosca na Sopa”, música de Raul Seixas. Aqui e ali uma jovem pegava o microfone e gritava “Pátria Livre!” e a multidão respondia: “Venceremos!” (paródia de um jargão do Fidel Castro). Depois voltava “Mosca na Sopa”, o cara dos “companheiros”, etc.

Pregados no trio elétrico havia alguns cartazes que diziam algo do tipo “pela vida”, ou “direito à vida”. Logo atrás do trio, um grupo de mulheres gritava ferozmente: “Direito do meu corpo, legalizar o aborto”. Dentre as alas, havia também os que gritavam pela legalização da maconha, os pichadores, e é claro, os sem-terra. Entende-se por ai a razão de certas ordens religiosas não mais participarem do “Grito”.

Depois de andarmos por várias ruas do centro velho de João Pessoa, chegamos ao ponto final, a Praça João Pessoa, também conhecida como Praça dos Três Poderes por causa da existência de diversos prédios públicos em suas imediações. O trio elétrico parou em frente ao Palácio da Redenção, sede o poder executivo estadual. Alguns discursavam, intercalados pelo músico do “Eu sou a mosca...”, o cara dos “companheiros” e a menina do “Pátria Livre!”. Quase ninguém prestava atenção.

Cada excluído era fechado no seu grupo, excluindo os outros de sua roda social. Era cada um com seu grito. Enquanto um grupo fazia uma espécie de dancinha de roda cultural, os cientistas sociais apontavam suas faixas em direção ao Palácio, onde em seu interior o batalhão de choque a polícia observava tudo já na posição de ataque. Tudo isso ao mesmo tempo dos discursos. Em certo momento, nem me lembro mais o porquê, queimaram uma revista Veja, como os mulçumanos da faixa de Gaza queimam bandeiras israelenses.

E assim foi até eu ir embora.

No Grito dos Excluídos, ou melhor, No Grito das moscas que pousam nas sopas, o que mais achei inadequado foi a diversidade de espécies, o sarapatel de ideologias. Eu mesmo não concordava com muitos dos discursos ali presentes (caso do aborto, da maconha e a pichação, por exemplo). Não considero coerente realizar um ato público onde as opiniões e idéias dos manifestantes entrem em conflito. Ao invés de um Grito dos Excluídos, poderiam ser vários Gritos. Cada grupo de excluídos realizando o seu “Grito” em separado (cada um no seu quadrado). O evento perde legitimidade por não ter objetivos claros. Assim, não deverá ter efeitos relevantes. Não passa da nervosa reunião de diversas classes marginalizadas. Praticamente não dá em nada.
.

Um comentário:

Anônimo disse...

Por mais que adorem esta liberdade toda eu penso que não temos liberdade alguma, nos deram direito a várias coisas mas não temos um povo socialmente bem idealizado